A preocupação constante dos moradores de alguns municípios do Vale do Araranguá em perder parte do território com a criação do "Refúgio da Vida Silvestre", na divisa entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul, voltou a ser tema de discussão entre os 15 prefeitos das cidades que integram a Associação dos Municípios do Extremo Sul Catarinense (Amesc). A criação da área de preservação ambiental, conforme o secretário executivo da Amesc, Jobson Martinho, atende a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado em 2004 no processo de licenciamento ambiental da usina hidrelétrica Barra Grande, implantada em Anita Garibaldi (RS) e Pinhal da Serra (RS), que alagou florestas e campos naturais na região.
A Amesc elaborou um ofício para pedir a interferência do governador Luiz Henrique da Silveira junto ao Ibama e à Presidência da República, para evitar a publicação de qualquer decreto neste sentido, solicitando maior integração para se ter uma melhor avaliação dos impactos. "A Presidência da República pode autorizar isso a qualquer momento. A informação que nos temos é de que seria após as eleições", disse Martinho.
Em princípio, previa-se apenas um corredor ecológico, e de acordo com Martinho, o Ibama, com base em estudos, resolveu propor a criação de uma Unidade de Proteção Integral na categoria "Refúgio da Vida Silvestre". O impasse estaria no fato de o estudo ter sido desenvolvido sem a participação efetiva dos estados e municípios envolvidos na questão. "O problema é que passando a ser Refúgio, aumenta a área de preservação e os estados e municípios ficaram de fora deste levantamento", enfatiza Martinho.
Áreas produtivas seriam reduzidas
A unidade de conservação classificada como "Refúgio da Vida Silvestre do Pelotas – RVS" entre a divisa dos dois estados, estendida até as encostas dos Aparados da Serra, abrange Jacinto Machado, Timbé do Sul e Morro Grande. Com isso, a preocupação das cidades impactadas estaria atrelada ao fato de haver redução nas áreas de produção.
Conforme Martinho, somente em Timbé do Sul, isso representaria 50% do território do município. "Em Morro Grande, é acima de 50% e Jacinto é entre 15% ou 20%. E ainda há mais um percentual de zona de amortecimento. Em Timbé, por exemplo, vai restringir o espaço de produção de arroz, chegando até a área urbana, podendo tirar os moradores", comentou.
Região abriga animais ameaçados de extinção e guarda centenas de nascentes de rios
Informações divulgadas no site do Ministério do Meio Ambiente dão conta de que após realizar o reconhecimento inicial da área, em abril de 2006, o Ministério emitiu ofícios a dirigentes dos estados e municípios envolvidos e a universidades, instituições de pesquisa e entidades de sociedade civil que atuam na região, solicitando a nomeação de representantes para acompanhar os trabalhos relativos à nova unidade de conservação. Seguiu-se a extensiva etapa de estudos de campo, de mapeamento da área e de sua fauna e flora.
O Ministério ainda deixa público, por meio da página na internet, que os estudos apontaram para mais de mil espécies vegetais nativas. Estima-se que habitem a área aproximadamente 20% do total de mamíferos da Mata Atlântica brasileira: cerca de 50 espécies. Algumas delas constam da lista oficial de espécies brasileiras ameaçadas de extinção, como o puma, a jaguatirica, o veado-campeiro e a lontra, entre outras.
A onça-pintada, o tamanduá-bandeira e o lobo-guará, antes comuns na região, podem já ter sido localmente extintos. A região, de acordo com o estudo do Ministério, abriga cerca de 50% das espécies de aves do Rio Grande do Sul e aproximadamente 45% das de Santa Catarina. Há ainda uma profusão de répteis, anfíbios e peixes. Em função do estado de preservação da área, não se descarta a hipótese de existirem espécies de fauna e flora ainda desconhecidas pela ciência.
A mata densa guarda também centenas de nascentes de rios que correm para o Oceano Atlântico. A área contribui também para a manutenção de nível do Aqüífero Guarani, um dos maiores reservatórios de água subsuperficiais do planeta.